quinta-feira, 7 de julho de 2022

Avosidade socioafetiva ou relação avoenga socioafetiva.

 

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Avosidade socioafetiva ou relação avoenga socioafetiva.

O Judiciário tem reconhecido o vínculo socioafetivo entre o cônjuge/ companheiro dos avós e os netos destes, nominando de avosidade socioafetiva ou relação avoenga socioafetiva.

Esse entendimento está em sintonia com o artigo 1.593 do Código Civil, que traz que o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem, bem como com o artigo 1.595 do CC, que diz que cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade.

Importante frisar que a avosidade socioafetiva não se confunde com a adoção avoenga. Pois, enquanto a adoção avoenga requer vínculo de neto (natural ou civil) e estado de filho socioafetivo entre o infante e o adotante, a avosidade socioafetiva está calcada, tão somente, na existência de relação socioafetiva entre a criança ou adolescente e o cônjuge dos avós, que se reconhecem como neto e avós.

Apesar do artigo 42§ 1º, do ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente, vedar expressamente a adoção entre os ascendentes e os descendes, o STJ – Superior Tribunal de Justiça tem entendido que tal vedação não é absoluta, podendo ser flexibilizada em circunstâncias excepcionais. Já escrevemos sobre o tema ( clique aqui para ler).

As decisões que acolhem a possibilidade da avosidade socioafetiva estão em harmonia com a moderna jurisprudência do STF - Supremo Tribunal Federal, que prestigia a multiparentalidade, fenômeno que ocorre quando se mantêm os vínculos biológicos, reconhecendo e acrescentando os vínculos socioafetivos, afastando qualquer hierarquização entre eles, entendimento cristalizado no julgamento do Recurso Extraordinário RE 898060/ SC, de 2016, paradigma do Tema de Repercussão Geral nº 622.

Citamos dois casos concretos para ilustrar este texto:

1.) A 4ª Câmara de Direito Privado do TJSP - Tribunal de Justiça de São Paulo, enfrentou o tema ao julgar a Apelação Cível nº 1019056-60.2018.8.26.0005, em 22/07/2021.

Consta do recurso que o autor da ação é casado com a avó materna do menor e, juntamente com ela, se dedica aos cuidados do infante desde tenra idade, inclusive obtendo a guarda dele ante o falecimento da mãe biológica da criança e o desconhecimento acerca de quem seria o pai biológico. O Colegiado entendeu presentes indícios de que a relação entre as partes é de avô e neto, relação que pretendem ver reconhecida.

Em seu voto, o Desembargador Maurício Campos da Silva Velho, relator, de ofício, reconheceu o cerceamento de defesa e decretou a nulidade da sentença, que julgou improcedente a ação de reconhecimento de relação avoenga socioafetiva. Apontou equívoco da sentença que tratou do caso como adoção avoenga. Ao final, ordenou o retorno do feito ao primeiro grau, posto que as provas documentais indiciárias autorizam a realização de estudos técnicos, que não foram realizados, para o fim de aquilatar a relação existente entre o autor e o menor. Votação unânime. Restando assim ementada:

APELAÇÃO. Reconhecimento de relação avoenga socioafetiva. Pretensão que não se confunde com adoção. Prova documental indiciária da relação e que autoriza a realização de estudos técnicos para averiguação da relação existente entre o autor e o menor. Cerceamento de defesa que se reconhece de ofício. Sentença anulada. Recurso prejudicado, com determinação de ofício.
(TJSP; Apelação Cível 1019056-60.2018.8.26.0005; Relator: Maurício Campos da Silva Velho; 4ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional V - São Miguel Paulista - 1ª Vara da Família e Sucessões; Julgamento: 22/07/2021; Registro: 22/07/2021).

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2.) O juiz João Batista Lopes, da 1ª Vara de Família de Juiz de Fora/ MG, ao julgar o Processo nº 5014345-64.2021.8.13.014, em sentença de janeiro de 2022, reconheceu o vínculo de avosidade socioafetiva entre a esposa do avô materno e a neta deste de seis anos de idade.

A primeira esposa do avô faleceu antes do nascimento da neta e ele se casou novamente e desde o nascimento da criança sua atual esposa desempenha a função de avó da infante e é reconhecida socialmente como tal.

O pedido de avosidade socioafetiva contou com a anuência expressa dos pais biológicos, dos avós paternos e do avô materno, bem como teve parecer favorável do Ministério Público, que discorreu acerca da existência de forte vínculo afetivo e de afinidade entre a criança e a esposa do avô, ante a convivência de forma estável e responsável, e o acolhimento pleno da neta.

O magistrado destacou que não há oposição ao pedido, foram satisfeitas as exigências legais, aliado ao relatório de estudo psicossocial que comprovou o vínculo de avosidade socioafetiva existente entre as partes, possibilitando o deferimento do pedido. Ao final, determinou a inclusão do nome da avó socioafetiva nos registros da criança, sem a exclusão do da avó biológica.

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Assim, restando provada nos autos que a relação existente entre o menor e o cônjuge/ companheiro dos avós é de neto/ avós, com caráter duradouro, benéfico ao infante, com afeto e cuidados, exteriorizada publicamente e assim reconhecida socialmente, estará configurado o vínculo de parentesco socioafetivo, com fulcro nos artigos 1.593 e 1.595 do Código Civil, evidenciando que neto e avô pertencem à mesma entidade familiar (art. 226 da Constituição Federal), merecendo especial proteção do Estado, solução que demostra interpretação histórico-evolutiva da jurisprudência se adequando a atual realidade social, objetivando regularizar situações de fato consolidadas, atendendo ao princípio constitucional do melhor interesse do menor, privilegiando as relações socioafetivas.

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Fontes: TJ-SP, TJ-MG, IBDFAM, Conjur, Imagem: Canva.com

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