terça-feira, 31 de outubro de 2023

Violência doméstica impede guarda compartilhada de filhos.

Nesse caso, o juiz determinará, de imediato, a guarda unilateral ao genitor não responsável pela violência.

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 O presidente Luís Inácio Lula da Silva, promulgou em 30/10/2023, a Lei nº 14.713/ 2023, que impede a guarda compartilhada de filhos quando há risco de qualquer tipo de violência doméstica ou familiar.

A Lei teve origem no Projeto de Lei (PL) 2.491/ 2019, foi aprovado em caráter conclusivo pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados. 

A lei altera o Código Civil e o Código de Processo Civil e determina a concessão da guarda para o genitor que não representa risco à criança, com o seguinte teor:

"Altera as Leis nºs 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), para estabelecer o risco de violência doméstica ou familiar como causa impeditiva ao exercício da guarda compartilhada, bem como para impor ao juiz o dever de indagar previamente o Ministério Público e as partes sobre situações de violência doméstica ou familiar que envolvam o casal ou os filhos".

A modificação legislativa:

"O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º O § 2º do art. 1.584 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 ( Código Civil), passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1.584. ............................ ...................................................
§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda da criança ou do adolescente ou quando houver elementos que evidenciem a probabilidade de risco de violência doméstica ou familiar. ..............................................”(NR)
Art. 2º A Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 ( Código de Processo Civil), passa a vigorar acrescida do seguinte art. 699-A:
“Art. 699-A. Nas ações de guarda, antes de iniciada a audiência de mediação e conciliação de que trata o art. 695 deste Código, o juiz indagará às partes e ao Ministério Público se há risco de violência doméstica ou familiar, fixando o prazo de 5 (cinco) dias para a apresentação de prova ou de indícios pertinentes.”
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 30 de outubro de 2023; 202o da Independência e 135o da República. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Portanto, como transcrito acima, há previsão, nas ações de guarda, antes de iniciada a audiência de mediação e conciliação, o juiz deverá perguntar às partes e ao Ministério Público se há risco de violência doméstica ou familiar, fixando o prazo de cinco dias para a apresentação da prova ou de indícios pertinentes. Na hipótese de haver, será concedida a guarda unilateral ao genitor não responsável pela violência.

A relatora, deputada do Projeto de Lei, Laura Carneiro, defendeu a aprovação da proposta lembrando que o Código Civil já prevê situações em que o juiz pode decidir, a bem dos filhos, pelo não compartilhamento da guarda. A parlamentar destacou ainda que o Estatuto da Criança e do Adolescente ( ECA), por sua vez, estabelece que “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

“As medidas previstas no PL 2.491/ 2019 vão ao encontro da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente, preconizados pela Carta Política de 1988 e previstos em legislação ordinária, reforçando-os, motivo pelo qual merecem prosperar”, disse a relatora.

Fontes: Agência Câmara de Notícias e Presidência da República.

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Execução de alimentos pelo rito da penhora permite inclusão de prestações vencidas no curso do processo

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A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que é possível incluir na execução de alimentos as parcelas da pensão vencidas no decorrer do processo, mesmo pelo rito da penhora, aplicando-se por analogia o que é previsto para o rito da prisão.

O colegiado concluiu que, ao se permitir a inclusão das parcelas a vencer no curso da execução de alimentos pelo rito da constrição patrimonial, evita-se a propositura de novas execuções com base na mesma relação jurídica, em respeito aos princípios da efetividade, da celeridade e da economia processual.

Ao julgar o caso, o tribunal estadual apontou que o dispositivo legal que permite a cobrança das parcelas vencidas no curso da execução seria próprio do rito da prisão do devedor, sendo incompatível com o dispositivo que regula a penhora. Portanto, de acordo com o tribunal, o pedido do credor resultaria na cumulação de ritos de execução alimentícia distintos, sem o devido amparo legal.

Semelhança entre os ritos permite a inclusão das parcelas a vencer

O relator do recurso no STJ, ministro Antonio Carlos Ferreira, reconheceu que, no caso da execução de alimentos pelo rito da penhora, não há previsão legal específica para inclusão das parcelas vincendas, diferentemente do que ocorre no rito da prisão, no qual a inclusão é autorizada expressamente pelo artigo 528, parágrafo 7º, do Código de Processo Civil (CPC).

"Contudo, deve-se conferir à norma uma interpretação lógico-sistemática, a fim de compreender seu alcance no conjunto do sistema jurídico. Sob esse aspecto, a inclusão das prestações a vencer no curso da execução não deve ser restrita ao rito da coerção pessoal, pois esse entendimento induziria o exequente a optar pelo procedimento mais gravoso ao executado – o da prisão", afirmou.

Segundo o ministro, se o credor for obrigado a ajuizar nova ação cada vez que a prestação alimentar vencer e não for paga, será muito mais cômodo para ele ajuizar, desde logo, o processo pelo rito da prisão, ou optar pela cumulação dos procedimentos (prisão e penhora), possibilidade já admitida pelo STJ em decisões anteriores. 

Para Antonio Carlos Ferreira, tendo em vista as semelhanças entre os dois procedimentos da execução de alimentos, é possível aplicar a analogia para estender ao rito da penhora a possibilidade prevista para o rito da prisão – uma alternativa que, segundo o ministro, evita a propositura de novas ações com base na mesma relação jurídica.  

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

STF analisa se é válido divórcio decretado sem prévia separação judicial.

O STF começou a julgar em 26/10/2023 a constitucionalidade da emenda constitucional (EC 66/ 2010) que criou o divórcio direto. Com a medida, ficou estabelecido que o casamento civil pode ser dissolvido pela solicitação do divórcio, sem separação judicial. O caso chegou a Corte por meio do Recurso Especial (RE) 1167478, de um cônjuge que contesta o mecanismo de divórcio direto, estabelecido pela Emenda. O resultado desse julgamento terá Repercussão Geral (Tema 1053)

Portanto, o tema em discussão é se a separação judicial é requisito para o divórcio e se ela continua a ser uma figura autônoma no ordenamento jurídico brasileiro. A decisão questionada é do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), para quem a EC 66/2010 afastou a exigência prévia da separação de fato ou judicial para o pedido de divórcio.

No Supremo, um dos cônjuges alega que o artigo 226, parágrafo 6º, da Constituição apenas tratou do divórcio, mas seu exercício foi regulamentado pelo Código Civil, que prevê a separação judicial prévia. Sustenta que seria equivocado o fundamento de que o artigo 226 tem aplicabilidade imediata, com a desnecessária edição ou observância de qualquer outra norma infraconstitucional.

Em contrarrazões, a outra parte defende a inexigibilidade da separação judicial após a alteração constitucional. Portanto, seguindo seu entendimento, não haveria qualquer nulidade na sentença que declarou o divórcio.

O STF decidirá se as normas que exigem a separação prévia, judicial ou de fato, para a efetivação do divórcio continuam válidas, mesmo após a retirada dessa exigência da Constituição Federal.

Tema 1053 - STF - Situação do Tema: Reconhecida a existência de repercussão geral.
Questão submetida a julgamento: Recurso extraordinário em que se examina, à luz do art. 226, § 6º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 66/2010, se a separação judicial é requisito para o divórcio e se ela subsiste como figura autônoma no ordenamento jurídico brasileiro.
Leading Case RE 1167478 - Relator: Min. Luiz Fux
Tema 1053 - Separação judicial como requisito para o divórcio e sua subsistência como figura autônoma no ordenamento jurídico brasileiro após a promulgação da EC nº 66/2010.
Repercussão geral

O julgamento deverá ser retomado na sessão de 8/11. Até o momento, há quatro votos, dois em cada sentido.

Separação x divórcio - O texto original da Constituição previa a dissolução do casamento civil pelo divórcio, mas exigia a separação judicial prévia por mais de um ano ou a comprovação da separação de fato por mais de dois anos. A Emenda Constitucional (EC) 66/ 2010 retirou essas exigências, mas não houve alteração no Código Civil no mesmo sentido.

Os ministros Luiz Fux (relator) e Cristiano Zanin entendem que as normas infraconstitucionais sobre a separação judicial perderam a validade com a Emenda Constitucional (EC) 66/2010, que retirou a exigência.

Já para os ministros André Mendonça e Nunes Marques, a separação judicial ainda pode ser aplicada, mas não é obrigatória, ou seja, quem quiser pode se divorciar diretamente ou pode só se separar.

Controvérsia - O Recurso Extraordinário (RE) 1167478 contesta uma decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que manteve sentença decretando o divórcio sem a separação prévia do casal. Segundo o TJ-RJ, após a EC 66/2010, basta a manifestação da vontade de romper o vínculo conjugal. No recurso ao Supremo, um dos cônjuges alega que a alteração constitucional não afasta as regras do Código Civil.

Simplificação - Em seu voto, o ministro Luiz Fux observou que a alteração constitucional buscou simplificar o rompimento do vínculo, eliminando as condicionantes. Com o novo texto, a dissolução do casamento não depende de nenhum requisito temporal ou causal, o que torna inviável exigir a separação judicial prévia para efetivar o divórcio.

Aplicação imediata - Para Fux, a nova regra constitucional é de eficácia plena e de aplicação imediata, ou seja, não precisa ser regulamentada para ter efetividade. O relator lembrou ainda que, em uma ação em que se pedia a fixação de pensão como requisito para o divórcio, o STF decidiu que as condicionantes para a dissolução do casamento não podem ultrapassar o que está previsto na Constituição. O ministro Cristiano Zanin acompanhou integralmente esse entendimento.

Sem vedação - Primeiro a divergir, o ministro André Mendonça considera que, como a Constituição não vedou a separação, não cabe ao Poder Judiciário, no âmbito de um contrato privado, estabelecer que essa exigência deixou de ser válida. No mesmo sentido, o ministro Nunes Marques considera que a EC 66/2010 visou acelerar o divórcio, mas não eliminou o instituto da separação judicial.

Nota nossa - Tratamos do tema no artigo "Casamento, Divórcio, Separação Judicial e Regimes de Bens: os julgados mais importantes do STF e do STJ" , publicado em 16/01/2019, do qual colhemos o seguinte fragmento:

"(...) Casamento: O casamento é um vínculo jurídico estabelecido formalmente entre duas pessoas, perante autoridade competente para constituírem família, estabelecendo comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. O casamento é regido pelo Direito de Família e pelo Código Civil (Livro IV, artigos 1.511 a 1.783).
Divórcio e Separação Judicial: Importante frisar que a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 66, de 2.010, modificou o artigo 226 da Constituição Federal para deixar de condicionar o divórcio à prévia separação judicial ou de fato, facilitando aos cônjuges o exercício pleno de sua autonomia privada. Ou seja: quem quiser pode se divorciar diretamente; quem preferir pode apenas se separar.
Embora a EC-66/2010 e o CPC/2015 não tenham abolido a figura da separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro, temos notado que, em sua grande maioria, os julgadores de primeiro grau não têm admitido a possibilidade de manejo da ação de separação judicial. Nem mesmo admitem a conversão da separação em divórcio. Ainda que exista prévia separação judicial, os juízes exigem entrar com o divórcio direto.
Portanto, depois de 2010, o divórcio passou a ser Direito potestativo, bastando para sua decretação a manifestação de uma das partes, sem termos ou condições, já que suprimida a exigência do requisito temporal e do sistema bifásico para que o casamento possa ser dissolvido pelo divórcio. Podendo, inclusive, ser decretado liminarmente pelo juízo
Temos, portanto, duas realidades: os juízes de primeiro grau que, em sua grande maioria, não admite a separação judicial, enquanto que o STJ a admite expressamente.
Diante disso, compartilhe conosco sua opinião e experiência profissional ao lidar com o tema (...)"

O julgamento deverá ser retomado na sessão de 8/11/2023.

Fonte: Supremo Tribunal Federal (STF).

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

STF aprova Súmula Vinculante 59 que prevê fixação de regime aberto e substituição de pena para tráfico privilegiado.

 

Na sessão desta quinta-feira (19/10/2023), o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou Proposta de Súmula Vinculante (PSV 139) para fixar que o regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade (prisão) por restritiva de direitos (alternativas à prisão) devem ser implementados quando reconhecida a figura do tráfico privilegiado.

O tráfico privilegiado está previsto na Lei de Drogas (Lei 11.343/2006, artigo 33parágrafo 4º) e consiste na diminuição da pena de um sexto (1/6) a dois terços (2/3) ao condenado por tráfico de drogas que:

  • for primário;
  • tiver bons antecedentes;
  • não se dedicar a atividades criminosas; e
  • não integrar organização criminosa.

A PSV 139 foi formulada inicialmente pelo ministro Dias Toffoli, quando exerceu a presidência do Tribunal. De acordo com o ministro, o STF já reconheceu que o tráfico de entorpecentes privilegiado não se harmoniza com a hediondez (maior gravidade do crime) do tráfico de drogas, o que, a seu ver, reforça o constrangimento ilegal da estipulação de regime inicial de cumprimento de pena mais gravoso, em especial o fechado, quando ausentes vetores negativos na primeira fase da dosimetria da pena.

A versão aprovada do texto teve o acréscimo sugerido pelo ministro Edson Fachin para que o benefício alcance a reincidência que não for específica, ou seja, no caso em que o réu não for reincidente pela prática do mesmo crime.

A redação aprovada para a súmula vinculante foi a seguinte:

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, acolheu a proposta de edição da Súmula Vinculante nº 59, com o seguinte teor:
“É impositiva a fixação do regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando reconhecida a figura do tráfico privilegiado (art. 33§ 4º, da Lei 11.343/2006) e ausentes vetores negativos na primeira fase da dosimetria (art. 59 do CP), observados os requisitos do art. 33, § 2º, alínea c, e do art. 44, ambos do Código Penal”.

Instrumento jurídico - A súmula vinculante é instrumento jurídico instituído pela Reforma do Judiciário (EC 45/2004) para conferir segurança jurídica e uniformização de decisões judiciais. Somente o STF edita súmula vinculante, cujo entendimento deve ser adotado pelos demais órgãos do Poder Judiciário e pela administração pública.

Vejamos o resumo do julgamento.

PSV 139 = "Aplicação do regime aberto e substituição da pena de prisão por sanções alternativas para réus primários condenados por tráfico privilegiado" (STF, Relator Ministro Dias Toffoli, Votação Unânime (10x0), Voto que prevaleceu: Ministro Dias Toffoli, Órgão julgador: Tribunal Pleno, Data do julgamento: 19/10/2023, Formato: Presencia).

Fatos - Trata-se de proposta de edição de súmula vinculante para fixar que pessoas condenadas por tráfico privilegiado de drogas (art. 33§ 4º, da Lei nº 11.343/2006, a “Lei de Drogas”) devem obrigatoriamente ter regime prisional aberto e ter sua pena de prisão substituída por pena restritiva de direitos. A súmula vinculante é um texto que obriga que decisões repetidas do Supremo Tribunal Federal sobre determinada questão constitucional sejam seguidas por todos os juízes e pelos órgãos da administração pública. No “tráfico privilegiado de drogas”, a lei permite reduzir a pena pela prática do crime de tráfico de drogas se a pessoa for primária (sem condenação criminal final anterior), de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa. Preenchidas essas condições, a lei garante o cumprimento da pena em condições menos severas, com regime aberto e a substituição da prisão por penas alternativas, como a prestação de serviços à comunidade.

Questões jurídicas: Em casos de réus primários, condenados por tráfico de drogas na modalidade privilegiada, o juiz deve fixar o regime aberto para o cumprimento da pena e substituir a prisão por pena alternativa?

Fundamentos da decisão:

1. O Supremo Tribunal Federal tem várias decisões que garantem o cumprimento da lei que prevê tratamento jurídico menos rigoroso ao condenado por tráfico de drogas que seja primário e de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa. Por exemplo: (i) reconheceu que o tráfico privilegiado (art. 33§ 4º, da Lei de Drogas) não é crime hediondo (crimes considerados mais graves pela Constituição) (HC 118.533); (ii) julgou inconstitucional a norma que impedia a substituição da pena de prisão por sanções alternativas ( HC 97.256); e (iii) julgou inconstitucional a regra que obrigava o juiz a estabelecer o regime inicial fechado para réus condenados por crimes hediondos ( HC 111.840).
2. Constituição exige que a sanção aplicada seja proporcional à gravidade do crime cometido (art. 5º, XLVI). Além disso, colocar réus primários, de bons antecedentes e não integrantes de organização criminosa no sistema carcerário facilita o seu recrutamento pelo crime organizado.
3. Porém, diversos juízes no país descumpriam o entendimento do Supremo Tribunal Federal. Aplicavam regime prisional mais rigoroso (fechado ou semiaberto) a pessoas condenadas por tráfico privilegiado e impediam a substituição da prisão por sanção alternativa. Diante desse quadro, o Tribunal considerou necessário editar súmula vinculante para tornar obrigatória a concessão do tratamento mais benéfico previsto na lei penal.

Votação e julgamento: Decisão unânime. Voto que prevaleceu: Min. Dias Toffoli (relator), Voto (s) divergente (s): Não há.

Resultado do julgamento: O STF decidiu que o regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade (prisão) por restritiva de direitos (alternativas à prisão) devem ser aplicados quando reconhecida a figura do tráfico privilegiado, ou seja, quando o condenado for primário, tiver bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas e não integrar organização criminosa. Ao aprovar Proposta de Súmula Vinculante (PSV 139), o Plenário reiterou que o tráfico de drogas privilegiado é menos grave que o crime de tráfico de drogas, de modo que não se justifica o cumprimento inicial da pena em regime fechado. A súmula vinculante é instrumento jurídico criado pela Reforma do Judiciário (EC 45/2004) para garantir segurança jurídica e a uniformização de decisões judiciais. Somente o STF pode editar uma súmula vinculante e seu entendimento deve ser adotado pelos demais órgãos do Poder Judiciário e pela administração pública.

Redação aprovada: “É impositiva a fixação do regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando reconhecida a figura do tráfico privilegiado (art. 33§ 4º, da Lei 11.343/06) e ausentes vetores negativos na primeira fase da dosimetria (art. 59 do CP), observados os requisitos do art. 33, § 2º, alínea c e do art. 44, ambos do Código Penal”.

Ao fim do julgamento, o presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que esse procedimento já era aplicado em tribunais superiores, mas que muitos julgadores não vinham seguindo este entendimento. Disse ainda que prender em casos de tráfico privilegiado é fornecer mão de obra para o crime organizado dentro das penitenciárias.

Fonte: Supremo Tribunal Federal (STF) - Classe e Número: PSV 139

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domingo, 22 de outubro de 2023

Condição financeira de um cônjuge não impede benefício da gratuidade de justiça para o outro

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A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial REsp 1998486/ SP, entendeu que a condição financeira do cônjuge não impede, necessariamente, o deferimento do benefício da gratuidade de justiça, sendo necessário verificar se a parte que o requer preenche os pressupostos específicos para a sua concessão. Para o colegiado, tal direito tem natureza personalíssima.

A decisão foi tomada no julgamento de recurso especial interposto contra decisao do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que negou o benefício a uma requerente, sob a justificativa de que seu cônjuge ostentaria padrão financeiro suficiente para arcar com as despesas processuais, sem prejuízo do sustento da família.

Nas alegações recursais, a parte sustentou ser mãe de três filhos, não exercer atividade remunerada nem possuir conta bancária de sua titularidade, sendo, dessa forma, hipossuficiente.

Regime do casamento pode influenciar, ou não, na análise do benefício - A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que tanto a Lei 1.060/1950 – a qual estabelece normas para a concessão de gratuidade aos necessitados – quanto artigo 99§ 6º, do Código de Processo Civil estabelecem que o direito ao benefício tem natureza personalíssima, de modo que os pressupostos legais para sua concessão deverão ser preenchidos, em regra, por quem o pleiteou.

A magistrada ressaltou que, em algumas situações, a condição financeira do cônjuge pode influir na decisão sobre deferimento ou indeferimento do benefício, em razão do regime matrimonial de bens e do dever de mútua assistência previsto no Código Civil (artigo 1.566, III), mas essas situações devem ser analisadas caso a caso.

Mesmo quando se verifica um forte vínculo entre a situação financeira dos dois cônjuges, isso não significa que o benefício requerido por um deles deva ser examinado à luz da condição econômica do outro, explicou.

Segundo a relatora, ainda que o regime de bens seja o da comunhão universal, a constatação de que o cônjuge pode bancar os custos do processo "nada mais representa do que a conclusão, por via transversa, de que a parte, em razão da mancomunhão, possui, ela própria, condições de arcar com as mencionadas verbas, o que afasta o deferimento do benefício".

Da mesma forma – continuou a magistrada –, caso se avalie que a parte pode arcar com os custos do processo, pois seu cônjuge é capaz de sustentar a família, isso significa que a própria parte preenche os pressupostos para o deferimento da gratuidade.

Despesas do processo são obrigação da parte, não de seu cônjuge -Já no caso de pessoas casadas em regime de separação de bens, se uma delas não tem patrimônio nem renda para suportar as despesas processuais, a situação financeira da outra não deve influenciar, em princípio, na análise sobre a concessão do benefício. "O que deve ficar claro é que a obrigação de arcar com os custos do processo é da própria parte, e não de seu cônjuge, sujeito estranho à relação jurídica processual", afirmou a ministra.

Quanto ao processo analisado, Nancy Andrighi lembrou que o TJSP consignou em seu acórdão que, além de o marido da requerente da gratuidade ter rendimentos suficientes para o pagamento das custas processuais, ela própria também teria recursos, sendo, inclusive, coproprietária de imóvel – fundamento que não foi impugnado no recurso especial.

No entender da ministra, o tribunal de origem se manifestou especificamente sobre a condição financeira da própria recorrente, concluindo que ela não teve êxito em demonstrar a alegada hipossuficiência financeira. Como o reexame de provas não é admitido pela Súmula 7 do STJ, o recurso não foi conhecido.

Seguindo esse norte, já decidiu o STJ que o "Menor tem direito à gratuidade da justiça independentemente da situação econômica dos seus pais". Clique aqui para ler.

O julgado restou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. NATUREZA JURÍDICA PERSONALÍSSIMA. PRESSUPOSTOS DEVEM SER PREENCHIDOS PELA PARTE REQUERENTE. CONDIÇÃO FINANCEIRA DO CÔNJUGE. INDIFERENÇA.
1. Recurso especial interposto em 29/7/2021 e concluso ao gabinete em 26/04/2022. 2. O propósito recursal consiste em dizer se o fato de o cônjuge da parte requerente possuir condições financeiras de arcar com as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, obsta, por si só e necessariamente, o deferimento do pedido de gratuidade da justiça. 3Extrai-se da natureza personalíssima do direito à gratuidade a conclusão de que os pressupostos legais para a sua concessão deverão ser preenchidos, em regra, pela própria parte que o requer4. Na hipótese em que o pedido de gratuidade da justiça é realizado por um dos cônjuges, poderá haver um forte vínculo entre a situação financeira dos consortes, sobretudo em razão do regime matrimonial de bens e o dever de mútua assistência previsto no inciso III do art. 1.566 do CCo que não significa dizer, todavia, que se deva, automática e isoladamente, examinar o direito à gratuidade a que poderia fazer jus um dos cônjuges à luz da situação financeira do outro5. A condição financeira do cônjuge não obsta, por si só e necessariamente, o deferimento dos benefícios da gratuidade da justiça, sendo necessário verificar se a própria parte que o requer preenche os pressupostos específicos para a sua concessão. 6. Na hipótese dos autos, a parte recorrente deixou de impugnar fundamento do acórdão recorrido apto a manter a conclusão do aresto impugnado, o que atrai a incidência do enunciado da Súmula 283 do STF. 7. Derruir a conclusão a que chegou a Corte de origem no sentido de que a recorrente possuiria significativo patrimônio, podendo arcar com os custos do processo, demandaria o reexame de fatos e provas o que é vedado pelo enunciado da Súmula 7 do STJ. Precedentes. 8. Recurso especial não conhecido (STJ, REsp n. 1.998.486/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 18/8/2022) - Grifo nosso.

-Fontes: Superior Tribunal de Justiça (STJ), -Fontes: Superior Tribunal de Justiça (STJ), "A Justiça Gratuita sob a ótica do STJ - Julgados relevantes", "Menor tem direito à gratuidade da justiça independentemente da situação econômica dos seus pais"