terça-feira, 3 de outubro de 2023

Da exoneração de alimentos do filho universitário.

 

Como é sabido por todos, os pais têm a obrigação legal de prestar alimentos aos filhos menores de idade, pois a necessidade deles é presumida. Esse dever tem lastro no Poder Familiar previsto no inciso IV, do art. 1.566, do Código Civil. Incabível, portanto, se falar em exoneração de alimentos nessa hipótese.

Já em relação aos filhos maiores de 18 (dezoito) anos, via de regra, os pais não têm mais obrigação de prestar alimentos, tendo em vista a cessação do poder familiar (art. 1.635III, do CC).

No entanto, esse encerramento não é automático, devendo ser requerido via judicial pelo devedor. Conforme Súmula 358, do STJ: “O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos”.

Isso porque ele poderá provar que necessita dos alimentos, como por exemplo em caso de doença ou estudo. Essa pretensão tem fulcro no Parentesco (art. 1.694, do CC). Portanto, mesmo para o filho maior de 18 (dezoito) anos, se frequentando curso superior ou técnico profissionalizante, os pais continuam tendo a obrigação legal de prestar alimentos. Como o filho está estudando, a jurisprudência considera que existe uma presunção de que ele necessita dos alimentos.

Entende-se, portanto, que a obrigação alimentar poderá perdurar por mais algum tempo, até que o filho complete o estudo técnico profissionalizante e/ ou superior, com idade e duração razoável, quando estará apto a ingressar no mercado de trabalho e prover a própria subsistência (STJ, Jurisprudência em Teses, nº 65/ 2016 - AgRg nos EDcl no AREsp 791322/SPREsp 1587280/ RS, e REsp 1292537/ MG).

Importante frisar que essa obrigação não se estende a pós-graduação, mestrado e doutorado (STJ, REsp 1505079/ MG. REsp 1312706/ AL e REsp 1218510/ SP).

Ocorre, no entanto, que alguns filhos postergam a conclusão do curso, seja se matriculando em apenas algumas matérias, seja mudando de curso, conseguindo manter indefinidamente o pagamento da pensão alimentícia.

O escopo desse estudo é esclarecer o que o Poder Judiciário entende por "idade e duração razoável", para a conclusão do curso superior ou profissionalizante.

Embora a doutrina e a jurisprudência entendam que a pensão alimentícia deve prorrogar-se até que o filho complete os estudos superiores ou profissionalizantes, fixam como idade razoável o limite de 24 (vinte e quatro) anos, de sorte que o mero fato de cursar ensino superior, para além dessa idade, não é fundamento para a continuidade do recebimento de pensão alimentícia.

Colhe-se da doutrina: "(...) Note-se que durante a menoridade, ou seja, até os dezoito anos de idade, não é necessário fazer prova da inexistência de meios próprios de subsistência, o que se presume pela incapacidade civil. No entanto, alcançada a maioridade, essa prova é necessária e, uma vez realizada, o filho continuará com o direito de ser alimentado pelos pais, inclusive no que se refere a verbas necessárias à sua educação, tendo em vista a complementação de curso universitário, em média ocorrida por volta dos vinte e quatro anos de idade. (MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito Civil: Direito de Família. 40. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 524/525, grifamos).

Vejamos alguns casos concretos:

Início tardio do curso - Sobre o tema decidiu o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, mantido pelo STJ:

"(...) Ação de Exoneração de Alimentos. Pensionamento de filha maior de 24 anos de idade, estudante de ensino superior. Comprovação da Apelante que cursa o ensino superior. Pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que, mesmo após a maioridade civil do beneficiário de pensão alimentícia, o dever de alimentar se estende até os 24 (vinte e quatro) anos de idade, desde que o alimentando comprove estar matriculado em instituição de ensino superior ou técnico profissionalizante. Apelante matriculada no 3º período do curso de direito, quando completou 24 (vinte e quatro) anos de idade, o que evidencia um adiamento no início da vida acadêmica do curso atual e, corrobora com as alegações do Apelado de que se encontrava matriculada em outro curso, nos anos anteriores, fato este que retardou a conclusão de ensino superior. Trata-se de pessoa sadia e apta ao trabalho, devendo buscar os meios necessários para sua subsistência. Ausência de condição excepcional, que tenha o condão de manter a obrigação do Apelado em continuar pagando a pensão alimentícia. Manutenção da sentença. Recurso desprovido"(STJ, AREsp 1378454/ RJ).

Mudança de curso - Vejamos precedente do TJDFT:

"(...) EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. MAIORIDADE CIVIL. 26 ANOS. CURSANDO NÍVEL SUPERIOR (...) 2. A pensão alimentícia, nesses casos, deve distender-se até que o filho complete os estudos superiores ou profissionalizantes, com idade razoável, e possa prover a própria subsistência, sendo que, por idade razoável, a doutrina e a jurisprudência têm utilizado como parâmetro os 24 (vinte e quatro) anos. 3. No caso, uma das filhas possui 26 (vinte e seis) anos de idade e ainda não concluiu o ensino superior porque resolveu mudar de curso, por livre e espontânea vontade, de sorte que o simples fato de cursar ensino superior, para além dos 24 (vinte e quatro) anos, não é fundamento para a continuidade do recebimento de pensão alimentícia. 4. O estímulo à qualificação profissional dos filhos não pode ser imposto ao alimentante de forma eterna e desarrazoada, sob pena de subverter o instituto da obrigação alimentar oriunda das relações de parentesco. (...) 7. Recurso conhecido e parcialmente provido."(TJDFT, APC nº 1065140, 20150111304217, Relator: Maria de Lourdes Abreu, 3a Turma Cível. Julgado em 16/11/2017, DJE: 12/12/2017).

Pós-graduação/ especialização - Precedentes do STJ desobrigam:

"(...) CURSO SUPERIOR CONCLUÍDO. REALIZAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO. NECESSIDADE/ POSSIBILIDADE. (...) 2. O advento da maioridade não extingue, de forma automática, o direito à percepção de alimentos, mas esses deixam de ser devidos em face do Poder Familiar e passam a ter fundamento nas relações de parentesco, em que se exige a prova da necessidade do alimentado.3. O estímulo à qualificação profissional dos filhos não pode ser imposto aos pais de forma perene, sob pena de subverter o instituto da obrigação alimentar oriunda das relações de parentesco, que tem por objetivo, tão só, preservar as condições mínimas de sobrevida do alimentado.4. Em rigor, a formação profissional se completa com a graduação, que, de regra, permite ao bacharel o exercício da profissão para a qual se graduou, independentemente de posterior especialização, podendo assim, em tese, prover o próprio sustento, circunstância que afasta, por si só, a presunção iuris tantum de necessidade do filho estudante.5. Persistem, a partir de então, as relações de parentesco, que ainda possibilitam a percepção de alimentos, tanto de descendentes quanto de ascendentes, porém desde que haja prova de efetiva necessidade do alimentado.6. Recurso especial não provido"(STJ. REsp n. 1.505.079/MG).

No mesmo sentido:

"(...) 2."Os filhos civilmente capazes e graduados podem e devem gerir suas próprias vidas, inclusive buscando meios de manter sua própria subsistência e limitando seus sonhos - aí incluídos a pós-graduação ou qualquer outro aperfeiçoamento técnico-educacional - à própria capacidade financeira". ( REsp 1218510/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 03/10/2011) 3. Portanto, em linha de princípio, havendo a conclusão do curso superior ou técnico, cabe à alimentanda - que, conforme a moldura fática, por ocasião do julgamento da apelação, contava 25 (vinte e cinco) anos de idade,"nada havendo nos autos que deponha contra a sua saúde física e mental, com formação superior"- buscar o seu imediato ingresso no mercado de trabalho, não mais subsistindo obrigação (jurídica) de seus genitores de lhe proverem alimentos. 4. Recurso especial provido para restabelecer a sentença"(STJ, REsp n. 1.312.706/ AL).

Mestrado - Julgado do STJ afastou a obrigação alimentar:

"(...) Em rigor, a formação profissional completa-se com a graduação, que, de regra, permite ao bacharel o exercício da profissão para a qual se graduou, independentemente de posterior especialização, podendo assim, em tese, prover o próprio sustento, circunstância que afasta, por si só, a presunção iuris tantum de necessidade do filho estudante. Assim, considerando o princípio da razoabilidade e o momento socieconômico do país, depreende-se que a missão de criar os filhos se prorroga mesmo após o término do poder familiar, porém finda com a conclusão, pelo alimentado, de curso de graduação. A partir daí persistem as relações de parentesco que ainda possibilitam a busca de alimentos, desde que presente a prova da efetiva necessidade. Com essas e outras considerações, a Turma deu provimento ao recurso para desonerar o recorrente da obrigação de prestar alimentos à sua filha"(STJ, REsp 1218510/ SP).

Graduação não concluída em prazo razoável:

"(...) AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. MAIORIDADE. RELAÇÃO DE PARENTESCO E SOLIDARIEDADE FAMILIAR. GRADUAÇÃO NÃO CONCLUÍDA. EXCESSO DE TEMPO RAZOÁVEL. ALIMENTOS. TEMPORARIEDADE. CAPACIDADE DE PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO (...) 3. À luz dos artigos 1.694 e 1.695 do Código Civil, pode o descendente, amparado na relação de parentesco e na solidariedade familiar, reivindicar a continuidade do pagamento de prestação alimentícia, antes lastreada no poder familiar, após alcançada a maioridade civil, quando demonstrada a frequência regular em entidade de ensino superior e a insuficiência de meios para prover o próprio sustento. 4. O término da graduação é tido como marco razoável para o início da possibilidade de ingresso no mercado de trabalho, cessando, a partir daí, a obrigação alimentar do ascendente para com o descendente. A regra, todavia, não é absoluta, demandando análise casuística conforme os vários elementos dispostos à apreciação do Juiz. 5. Descabe eternizar o pagamento de pensão alimentícia em razão de estar o filho frequentando instituição de ensino superior, quando extrapolado prazo razoável para conclusão do curso. 6. Sendo o apelante plenamente capaz de prover seu próprio sustento, não padecendo de enfermidade ou deficiência que limite suas condições físicas ou mentais, e usufruindo de tempo suficiente para qualificação profissional, deve-se afastar a obrigação alimentar, sob pena de subverter a temporariedade inerente ao instituto. 7. Recurso conhecido e parcialmente provido."(TJDFT, Ac. n. 1093139, Relator Des. Eustáquio de Castro, j. 26/04/2018).

Pedido subsidiário - Na hipótese de se propor ação exoneratória, é possível e conveniente fazer pedido subsidiário no sentido de que, uma vez desacolhida a exoneração, seja conhecido o pedido revisional de alimentos (art. 1.699, do CC), no sentido de minorar o valor da pensão alimentícia, conforme autoriza o artigo 326, do CPC. Já decidiu o STJ:

(...) Nos termos da orientação jurisprudencial desta Corte Superior,"não é extra petita a sentença que, diante do pedido de exoneração total de pensão, defere a redução dos alimentos. Como se sabe, no pedido mais abrangente se inclui o de menor abrangência"(STJ, REsp 249513/ SP e AgRg no REsp 1352321/ PB).

E ainda:

" (,,,) Inviável, em sede de recurso especial, modificar o acórdão recorrido que, observando o binômio necessidade/ possibilidade, entendeu não ser possível acolher o pedido de exoneração, mas, sim, o pedido alternativo de redução da verba alimentar originalmente fixada, tendo em vista que a análise do tema demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado, nos termos da Súmula nº 7/STJ". (STJ, AgRg no REsp 1284685/ SE).

Portanto, apesar da exoneração da pensão não se operar automaticamente, quando o filho completar 24 (vinte e quatro) anos ou concluir curso superior, o que ocorrer primeiro, se buscado o Judiciário e garantido o contraditório, deve a decisão judicial exonerar os genitores da obrigação alimentar.

Frise-se, no entanto, que mesmo estudando e não atingido os 24 anos, o dever de pagar pensão alimentícia findará como o casamento ou a união estável do filho, pois cessa a presunção de necessidade (art. 1.708, do Código Civil).

------> Fontes: STJ; TJRJ; TJDFT; nossos artigos: Exoneração de alimentos; A Pensão Alimentícia sob a ótica do STJ; Ação Revisional de Alimentos.

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