domingo, 21 de agosto de 2022

Nova ferramenta digital do CNJ permite identificar ativos e patrimônios em segundos (Justiça 4.0) SNIPER - "Caça fantasmas de bens"

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Nova ferramenta digital do CNJ permite identificar ativos e patrimônios em segundos (Justiça 4.0)

SNIPER - Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos, ou “Caça fantasmas de bens", segundo o ministro Fux


O  Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou, nesta terça-feira (16/8/2022), ferramenta digital para agilizar e centralizar a busca de ativos e patrimônios em diversas bases de dados. O Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (Sniper), desenvolvido no Programa Justiça 4.0, identifica em segundos os vínculos patrimoniais, societários e financeiros entre pessoas físicas e jurídicas.

Com isso, a expectativa é que a busca de ativos – que hoje chega a levar meses e mobiliza uma equipe especializada em investigação patrimonial a partir da análise de documentos – possa ser feita rapidamente. Os resultados são representados em gráficos, de fácil compreensão pela magistratura, indicando as ligações entre os atores de forma simples e eficiente, o que contribui para reduzir o tempo de conclusão dos processos na fase de execução e cumprimento de sentença – o maior gargalo atual dos processos judiciais.

Clique aqui e assista o vídeo "Conheça o Sniper: investigação patrimonial em segundos".​

De acordo com o último relatório Justiça em Números, existem quase 40 milhões de processos com execução pendente, o que corresponde a mais da metade (58%) do total de processos pendentes (75 milhões). Para receber uma sentença, o processo leva, desde a data de ingresso, quase o triplo de tempo na fase de execução (4 anos e 7 meses) em comparação com a fase de conhecimento (1 ano e 7 meses). A taxa de congestionamento durante a execução é de 84%. Ou seja, são processos que ficam aguardando bens, ativos ou direitos passíveis de constrição judicial para uma solução e o cumprimento da sentença judicial.

Segundo explica o ministro Luiz Fux, o Sniper é um sistema que vai aprimorar a atuação do Judiciário. “É o caça-fantasmas de bens, que passa a satisfazer não só as execuções, mas também a recuperação de ativos decorrentes dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.”, afirmou. A solução dificulta a ocultação patrimonial e aumenta a possibilidade de cumprimento de uma ordem judicial em sua totalidade, com a identificação de recursos para o pagamento de dívidas, especialmente na área fiscal.

Para a coordenadora da Unidade de Paz e Governança do Pnud no Brasil, Moema Freire, o Sistema é uma inovação importante e estreitamente alinhada com a Agenda 2030 pactuada pelos países membros das Nações Unidas. “O Sniper favorece ganhos de efetividade na atuação da Justiça, bem como se soma aos esforços anticorrupção, representando uma importante contribuição para novos avanços rumo às metas previstas no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável de número 16, que trata das dimensões de Paz, Justiça e Instituições Eficazes.”

“O Sniper foi desenvolvido para trazer agilidade e eficiência na descoberta de relações e vínculos de interesse do processo judicial. Ele permite a melhor compreensão das provas produzidas em processos judiciais de crimes financeiros complexos, como a corrupção e lavagem de capitais, em segundos e com maior eficiência”, explica Dorotheo Barbosa Neto, juiz auxiliar da presidência do CNJ que está à frente do projeto. Segundo ressalta Barbosa Neto, a ferramenta deverá beneficiar a nota brasileira de execução de contratos, com impactos positivos em seu ambiente de negócios, medido pelo Doing Business, ranking do Banco Mundial que analisa 190 economias.

Como funciona

Com uma interface amigável e navegação intuitiva em plataforma web, o Sniper já disponibiliza uma consulta rápida e ágil a bases de dados abertas e fechadas, com a possibilidade de incluir novas bases de informações. O acesso ao sistema só é ser feito por pessoas autorizadas, a partir da decisão de quebra de sigilo, para garantir a segurança das informações.

Usuários e usuárias podem buscar dados de pessoas físicas e jurídicas pelo nome, CPF, razão social, nome fantasia ou CNPJ. A informação é traduzida visualmente em grafos, que evidenciam as relações entre pessoas físicas e pessoas jurídicas e agilizam o processo de identificação dos grupos econômicos. É possível visualizar as informações, a relação de bens e ativos (incluindo aeronaves e embarcações) e as relações com outras pessoas físicas e jurídicas. As informações podem ser exportadas em um relatório no formato .pdf e anexadas a um processo judicial.

Clique aqui para assistir a animação.

Atualmente, já estão integrados ao Sniper os dados de CPF e CNPJ, as bases de candidatos e bens declarados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), informações sobre sanções administrativas, empresas punidas e acordos de leniência (CGU), dados do Registro Aeronáutico Brasileiro ( Anac), embarcações listadas no Registro Especial Brasileiro (Tribunal Marítimo) e informações sobre processos judiciais, como partes, classe, assunto dos processos e valores (cabeçalho processual, do CNJ).

No módulo de dados sigilosos, poderão ser adicionadas informações fiscais e bancárias, com acesso restrito a usuários autorizados, a partir da integração com o Infojud e Sisbajud.

A ferramenta foi desenvolvida por uma equipe multidisciplinar do CNJ e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com a participação de profissionais de tecnologia e especialistas em Direito e em investigação patrimonial. Por ser integrada à Plataforma Digital do Poder Judiciário, não há necessidade de desenvolvimento adicional por parte dos tribunais.

Para capacitar profissionais do Judiciário que vão utilizar a ferramenta, será lançado em setembro um curso autoinstrucional no Portal EAD do CNJ. Detalhes sobre carga horária e abertura das inscrições serão divulgados em breve.

Justiça 4.0  

O Sniper integra o portfólio de mais de 30 projetos do Programa Justiça 4.0, iniciativa do CNJ, Pnud e Conselho da Justiça Federal (CJF) que desenvolve soluções tecnológicas disruptivas para acelerar a transformação digital do Poder Judiciário brasileiro. O programa conta, ainda, com o apoio do TSE, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Créditos= Texto: Vanessa Maeji, Edição: Márcio Leal, Agência CNJ de Notícias, Imagem: arte sobre foto de Rômulo Serpa/ Agência CNJ.






quarta-feira, 10 de agosto de 2022

A impossibilidade da penhora total da conta conjunta

 

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A Corte Especial do STJ - Superior Tribunal de Justiça, em 15/06/2022, por unanimidade, deu provimento ao Recurso Especial nº 1610844/ BA, admitido como paradigma do Tema IAC 12 (Incidente de Assunção de competência) objetivando a delimitação da controvérsia de definir a possibilidade ou não de penhora integral de valores depositados em conta bancária conjunta, na hipótese de apenas um dos titulares ser sujeito passivo de processo executivo movido por pessoa - física ou jurídica - distinta da instituição financeira mantenedora da conta corrente.

Há divergência atual entre julgados das Turmas de Direito Privado e de Direito Público sobre o tema que envolve, basicamente, a interpretação da norma inserta no artigo 265 do Código Civil, segundo o qual "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes". Razão pela qual foi instaurado a Assunção de Competência à Corte Especial do STJ, com fulcro no § 4º do artigo 947 do CPC e com o julgamento sua aplicação deverá ser feita em casos coincidentes pelos tribunais inferiores.

Resumidamente, a Corte Especial do STJ decidiu que:

A) É presumido, em regra, o rateio em partes iguais do numerário mantido em conta corrente conjunta solidária quando inexistente previsão legal ou contratual de responsabilidade solidária dos correntistas pelo pagamento de dívida imputada a um deles.
B) Não será possível a penhora da integralidade do saldo existente em conta conjunta solidária no âmbito de execução movida por pessoa (física ou jurídica) distinta da instituição financeira mantenedora, sendo franqueada aos cotitulares e ao exequente a oportunidade de demonstrar os valores que integram o patrimônio de cada um, a fim de afastar a presunção relativa de rateio.
(STJ, REsp 1.610.844-BA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 15/06/2022. ( Tema IAC 12) - Informativo de Jurisprudência nº 741 de junho de 2022).

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Fixando o seguinte Tema: "Penhora de saldo em conta corrente conjunta. Extensão. Presunção relativa de rateio em partes iguais. Integralidade dos valores. Pessoa física ou jurídica distinta da instituição financeira mantenedora. Demonstração dos valores que integram o patrimônio de cada um" ( Tema IAC 12/STJ).

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O julgado restou assim ementado:

INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXTENSÃO DA PENHORA DE SALDO EM CONTA-CORRENTE CONJUNTA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE RATEIO EM PARTES IGUAIS.
1. No que diz respeito à "conta conjunta solidária" - também chamada conta "E/OU", em que qualquer um dos titulares pode realizar todas as operações e exercer todos os direitos decorrentes do contrato de conta-corrente, independentemente da aprovação dos demais -, sobressai a solidariedade ativa e passiva na relação jurídica estabelecida entre os cotitulares e a instituição financeira mantenedora, o que decorre diretamente das obrigações encartadas no contrato de conta-corrente, em consonância com a regra estabelecida no artigo 265 do Código Civil.
2. Por outro lado, a obrigação pecuniária assumida por um dos correntistas perante terceiros não poderá repercutir na esfera patrimonial do cotitular da "conta conjunta solidária" caso inexistente disposição legal ou contratual atribuindo responsabilidade solidária pelo pagamento da dívida executada.
3. É que o saldo mantido na "conta conjunta solidária" caracteriza bem divisível, cuja cotitularidade, nos termos de precedentes desta Corte, atrai as regras atinentes ao condomínio, motivo pelo qual se presume a repartição do numerário em partes iguais entre os correntistas quando não houver elemento probatório a indicar o contrário, ex vi do disposto no parágrafo único do artigo 1.315 do Código Civil ( REsp n. 819.327/SP, relator Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJ de 8.5.2006). Tal presunção de rateio pro rata de bens e obrigações pertencentes a mais de uma pessoa decorre do princípio concursu partes fiunt, que também se encontra encartado nos artigos 257 (obrigações divisíveis), 272 (obrigações solidárias) e 639 (contrato de depósito) do Código Civil.
4. Nesse quadro, à luz do princípio da responsabilidade patrimonial do devedor - enunciado nos artigos 591 e 592 do CPC de 1973 (reproduzidos nos artigos 789 e 790 do CPC de 2015)-, a penhora eletrônica de saldo existente em "conta conjunta solidária" não poderá abranger proporção maior que o numerário pertencente ao devedor executado, devendo ser preservada a cota-parte dos demais correntistas.
5. Sob tal ótica, por força da presunção do rateio igualitário do saldo constante da "conta coletiva solidária", caberá ao "cotitular não devedor" comprovar que o montante que integra o seu patrimônio exclusivo ultrapassa o quantum presumido. De outro lado, poderá o exequente demonstrar que o devedor executado é quem detém a propriedade exclusiva - ou em maior proporção - dos valores depositados na conta conjunta.
6. Tese jurídica firmada para efeito do artigo 947 do CPC: "a) É presumido, em regra, o rateio em partes iguais do numerário mantido em conta corrente conjunta solidária quando inexistente previsão legal ou contratual de responsabilidade solidária dos correntistas pelo pagamento de dívida imputada a um deles. b) Não será possível a penhora da integralidade do saldo existente em conta conjunta solidária no âmbito de execução movida por pessoa (física ou jurídica) distinta da instituição financeira mantenedora, sendo franqueada aos cotitulares e ao exequente a oportunidade de demonstrar os valores que integram o patrimônio de cada um, a fim de afastar a presunção relativa de rateio."
7. Solução do caso concreto: afigura-se impositiva a reforma do acórdão estadual, pois, malgrado o recorrente não tenha comprovado o seu direito à totalidade do saldo existente na conta conjunta, é certo que o bloqueio judicial deveria se restringir aos 50% que se presumem pertencentes ao cotitular executado.
8. Recurso especial provido a fim de determinar que a penhora fique limitada à metade do numerário encontrado na conta-corrente conjunta solidária.
REsp n. 1.610.844/BA, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 15/6/2022, DJe de 9/8/2022.)

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Informações do inteiro teor: A controvérsia está em definir a possibilidade ou não de penhora integral de valores depositados em conta bancária conjunta, na hipótese de apenas um dos titulares ser sujeito passivo de processo executivo movido por pessoa - física ou jurídica - distinta da instituição financeira mantenedora da conta corrente.

Há divergência atual entre julgados das Turmas de Direito Privado e de Direito Público sobre o tema que envolve, basicamente, a interpretação da norma inserta no artigo 265 do Código Civil, segundo o qual "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes".

Com efeito, os precedentes das Turmas da Primeira Seção assentam que, ainda que só um dos titulares da conta conjunta seja responsável pela dívida executada, a penhora deve atingir a integralidade do saldo depositado se não houver prova da titularidade exclusiva ou parcial dos valores, ante a presunção de que os co-correntistas pactuaram a ausência de exclusividade da disponibilidade do numerário.

Por sua vez, os acórdãos das Turmas da Segunda Seção adotam a exegese de que, em se tratando de execução movida por pessoa (física ou jurídica) distinta da instituição financeira mantenedora da conta bancária coletiva, deve ser franqueada aos cotitulares a comprovação dos valores que integram o patrimônio de cada um, sendo certo que, na ausência de provas nesse sentido, presume-se a divisão do saldo em partes iguais, razão pela qual a penhora não poderá atingir a integralidade do numerário, mas apenas a cota-parte do correntista executado.

O exercício do aludido poder-dever do juiz - no âmbito da execução forçada direta - encontra limite político no princípio da responsabilidade patrimonial, enunciado nos arts. 591 e 592 do CPC/1973 (reproduzidos nos arts. 789 e 790 de CPC/2015), que versam sobre a sujeição dos bens do "devedor obrigado" (responsabilidade primária) e do "terceiro não obrigado" (responsabilidade secundária) à demanda executória.

Depreende-se que, em regra, somente os bens integrantes do patrimônio do devedor - a um só tempo obrigado e responsável - estão sujeitos à excussão destinada a obter soma em dinheiro apta ao adimplemento da prestação (pecuniária ou de dar coisa) encartada em título judicial ou extrajudicial.

A conta-corrente configura instrumento contratual que viabiliza outras operações bancárias, a exemplo do depósito, do empréstimo e da abertura de crédito. Tal contrato bancário alberga duas espécies: (i) a conta-corrente individual ou unipessoal, que possui um único titular, detentor do poder de movimentá-la, o qual pode ser outorgado a procurador devidamente constituído; e (ii) a conta-corrente conjunta ou coletiva, na qual há mais de um titular com poder de movimentação da conta.

Em se tratando de "conta conjunta solidária", sobressai a solidariedade ativa e passiva na relação jurídica estabelecida entre os cotitulares e a instituição financeira mantenedora, o que decorre diretamente das obrigações encartadas no contrato de conta-corrente, em consonância com a regra estabelecida no art. 265 do CC/2002.

Por outro lado, a obrigação pecuniária assumida por um dos correntistas perante terceiros não poderá repercutir na esfera patrimonial do cotitular da "conta conjunta solidária", caso inexistente disposição legal ou contratual atribuindo responsabilidade solidária pelo pagamento da dívida executada.

Nessa perspectiva, há julgados desta Corte que, com base na Lei n. 7.357/1985, entendem que os cotitulares da aludida espécie de conta conjunta não ostentam a condição de devedores solidários nem sequer perante terceiros portadores de cheques emitidos, sem provisão de fundos, somente por um dos correntistas.

Nessa ordem de ideias, infere-se que o saldo mantido na chamada "conta conjunta solidária" caracteriza bem divisível, cuja cotitularidade, nos termos de precedentes desta Corte, atrai as regras atinentes ao condomínio, motivo pelo qual se presume a repartição do numerário em partes iguais entre os correntistas quando não houver elemento probatório a indicar o contrário, consoante disposto no parágrafo único do art. 1.315 do CC/2022 ( REsp n. 819.327/SP, relator Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJ de 08/05/2006).

Consequentemente, à luz do princípio da responsabilidade patrimonial do devedor - enunciado nos arts. 591 e 592 do CPC/1973 (reproduzidos nos arts. 789 e 790 do CPC/2015)-, a penhora eletrônica de saldo existente em "conta conjunta solidária" não poderá abranger proporção maior que o numerário pertencente ao devedor executado, devendo ser preservada a cota-parte dos demais correntistas.

Sob tal ótica, por força da presunção do rateio igualitário do saldo constante da "conta coletiva solidária", caberá ao "cotitular não devedor" comprovar que o montante que integra o seu patrimônio exclusivo ultrapassa o quantum presumido. De outro lado, poderá o exequente demonstrar que o devedor executado é quem detém a propriedade exclusiva - ou em maior proporção - dos valores depositados na conta conjunta.

Desse modo, quando existente prova de titularidade exclusiva dos valores depositados por aquele que não figura no polo passivo da execução de obrigação pecuniária não solidária, afigurar-se-á impositiva a desconstituição da penhora.