sábado, 28 de março de 2020

STJ admite alimentos em valores distintos para filhos de diferentes relacionamentos

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o REsp 1624050/MG, em 19.6.2018, admitiu que pensões alimentícias pagas por um pai a filhos de relacionamentos diferentes possam ser fixadas em valores distintos. O colegiado levou em consideração a capacidade financeira das mães das crianças.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) havia reduzido uma das pensões de 20% para 15% sobre os rendimentos líquidos do pai. A mãe interpôs recurso especial sob o fundamento de que a decisão teria dado tratamento discriminatório entre os filhos, uma vez que foi destinado ao outro filho, fruto de outro relacionamento, o percentual de 20%.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, reconheceu que, em regra, não se deve fixar a obrigação de alimentos em valor absoluto ou percentual diferente entre a prole, uma vez que os filhos, indistintamente, necessitam ter acesso a condições dignas de sobrevivência em igual medida.
Natureza flexível
No entanto, a ministra destacou que essa igualdade não é um princípio de natureza inflexível e, no caso apreciado, não reconheceu nenhuma ilegalidade na decisão do TJMG. Segundo ela, as instâncias ordinárias verificaram que a mãe que recorreu da decisão possui maior capacidade contributiva do que a genitora da criança que recebe o percentual maior.
“É dever de ambos os cônjuges contribuir para a manutenção dos filhos na proporção de seus recursos. Assim, poderá ser justificável a fixação de alimentos diferenciados entre a prole se, por exemplo, sendo os filhos oriundos de distintos relacionamentos, houver melhor capacidade de contribuição de um genitor ou genitora em relação ao outro”, disse a ministra.
Reais necessidades
Nancy Andrighi citou ainda outro exemplo de arbitramento diferenciado de pensão que seria justificável e não ofensivo ao princípio da igualdade. Ela chamou atenção para a importância de serem avaliadas as reais necessidades dos filhos, como no caso de um recém-nascido, incapaz de desenvolver quaisquer atividades, e um filho mais velho, capaz de trabalhar.
“Seria possível cogitar de uma potencial violação ao princípio da igualdade entre filhos se houvesse sido apurado que eles possuem as mesmas necessidades essenciais e que as genitoras possuem as mesmas capacidades de contribuir para a manutenção de tais necessidades, mas, ainda assim, houvesse a fixação em valor ou patamar distinto. Dessa situação, contudo, não se trata na hipótese dos autos, motivo pelo qual não merece reparo o acórdão recorrido no particular”, concluiu a relatora.
O julgado restou assim ementado:
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS. DIFERENÇA DE VALOR OU DE PERCENTUAL NA FIXAÇÃO DOS ALIMENTOS ENTRE FILHOS. IMPOSSIBILIDADE, EM REGRA. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE ENTRE FILHOS, TODAVIA, QUE NÃO POSSUI CARÁTER ABSOLUTO. POSSIBILIDADE DE EXCEPCIONAR A REGRA QUANDO HOUVER NECESSIDADES DIFERENCIADAS ENTRE OS FILHOS OU CAPACIDADES DE CONTRIBUIÇÕES DIFERENCIADAS DOS GENITORES. DEVER DE CONTRIBUIR PARA A MANUTENÇÃO DOS FILHOS QUE ATINGE AMBOS OS CÔNJUGES. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. COGNIÇÃO DIFERENCIADA ENTRE PARADIGMA E HIPÓTESE. PREMISSAS FÁTICAS DISTINTAS.
1- Ação distribuída em 06/03/2012. Recurso especial interposto em 22/04/2015 e atribuído à Relatora em 26/08/2016. 2- O propósito recursal consiste em definir se é ou não admissível a fixação de alimentos em valores ou em percentuais diferentes entre os filhos. 3- Do princípio da igualdade entre os filhos, previsto no art. 227§ 6º, da Constituição Federal, deduz-se que não deverá haver, em regra, diferença no valor ou no percentual dos alimentos destinados a prole, pois se presume que, em tese, os filhos - indistintamente - possuem as mesmas demandas vitais, tenham as mesmas condições dignas de sobrevivência e igual acesso às necessidades mais elementares da pessoa humana. 4- A igualdade entre os filhos, todavia, não tem natureza absoluta e inflexível, devendo, de acordo com a concepção aristotélica de isonomia e justiça, tratar-se igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades, de modo que é admissível a fixação de alimentos em valor ou percentual distinto entre os filhos se demonstrada a existência de necessidades diferenciadas entre eles ou, ainda, de capacidades contributivas diferenciadas dos genitores. 5- Na hipótese, tendo sido apurado que havia maior capacidade contributiva de uma das genitoras em relação a outra, é justificável que se estabeleçam percentuais diferenciados de alimentos entre os filhos, especialmente porque é dever de ambos os cônjuges contribuir para a manutenção dos filhos na proporção de seus recursos. 6- Não se conhece do recurso especial pelo dissídio jurisprudencial quando houver substancial diferença entre a cognição exercida no paradigma e a cognição exercida na hipótese, justamente porque são distintas as premissas fáticas em que se assentam os julgados sob comparação. Precedentes. 7- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (STJ - REsp 1624050/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 22/06/2018)
(STJ - Informativo de Jurisprudência n. 0628, de 03.8.2018).

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