quinta-feira, 31 de março de 2022

Amante não pode ser beneficiária de seguro de vida instituído por homem casado, segundo STJ

 

Ao julgar o REsp 1391954/ RJ, de 31/3/2022, a 4a Turma do STJ, definiu que o seguro de vida não pode ser instituído por pessoa casada – que não é separada judicialmente, nem de fato – em benefício de parceiro em relação concubinária, por força de expressa vedação legal presente nos artigos 550 e 793 do Código Civil.

Com esse entendimento, por maioria, o colegiado deu parcial provimento para reformar decisão do TJRJ que determinou o pagamento do valor do seguro de vida à beneficiária indicada pelo segurado falecido.

Segundo o processo, o segurado, sem ter dissolvido seu matrimônio, convivia com a concubina desde os anos 1970, de forma pública e contínua, ao mesmo tempo em que mantinha o relacionamento com a esposa. Ciente de que a companheira ficaria fora de sua herança, ele instituiu seguro de vida em que a apontou como beneficiária (75%), ao lado do filho que teve com ela (25%) – o qual foi indicado como segundo beneficiário, para receber o total da indenização caso a mãe não pudesse receber sua parte.

No recurso especial apresentado ao STJ, a viúva alegou que seria ilegal a designação da concubina como beneficiária do seguro, razão pela qual pediu a reforma do acórdão do TJRJ, para que o saldo de 75% dos valores depositados pelo falecido fosse destinado a ela, e não à outra.

Ordenamento jurídico consagra monogamia e fidelidade - A relatora do caso, ministra Isabel Gallotti, explicou que a jurisprudência fixada pelo STJ com base no Código Civil de 1916, e depois positivada no artigo 793 do CC/ 2002, veda que a concubina seja beneficiária de seguro de vida instituído por homem casado e não separado de fato.

A magistrada destacou ainda o recente entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 1045273/ SE sobre a impossibilidade de reconhecimento de novo vínculo conjugal quando preexistente casamento ou união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723§ 1º, do Código Civil, inclusive para fins previdenciários.

De acordo com Gallotti, a orientação do STF considera que os ideais monogâmicos subsistem na ordem constitucional para o reconhecimento do casamento e da união estável, o que inclui a previsão da fidelidade recíproca como dever dos cônjuges (artigo 1.566I, do Código Civil).

Pagamento do capital segurado ao segundo beneficiário - De acordo com a ministra, como a designação da concubina na apólice foi inválida, a indenização deve ser paga respeitando a indicação alternativa feita pelo falecido para a hipótese de a primeira beneficiária não poder recebê-la – ou seja, ao filho que ambos tiveram.

"Somente na falta também do segundo beneficiário incidiria a regra do artigo 792 do Código Civil, segundo o qual, 'na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que foi feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem de vocação hereditária'", completou a relatora.

Com o parcial provimento do recurso, o colegiado afastou o direito da primeira beneficiária (a concubina) e determinou o pagamento do capital segurado ao segundo beneficiário (o filho), conforme a indicação.

Oportuno indicar nosso artigo sobre União Estável ( clique aqui para ler) onde citamos que o Judiciário traz a distinção entre companheiro e concubino, afirmando que o primeiro conta com a proteção do Estado, posto que legítima a união estável, e o segundo não. Cumpre trazer à colação, relevante voto proferido, no âmbito da 1ª Turma do STF, pelo Ministro Marco Aurélio, no RE 397.762/ BA, cuja ementa segue reproduzida, na parte que interessa:

- “COMPANHEIRA E CONCUBINA - DISTINÇÃO. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel.
- UNIÃO ESTÁVEL - PROTEÇÃO DO ESTADO. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato.” (STF, Ministro Marco Aurélio, no RE n. 397.762/ BA - transcrito, na íntegra, logo abaixo).

Naquele julgado, o Ministro Marco Aurélio assinalou que o concubinato não merece proteção do Estado por conflitar com o direito posto. A relação, para o Ministro, não se iguala à união estável que é reconhecida constitucionalmente e apenas gera, quando muito, a denominada sociedade de fato, no que foi acompanhado pelos Ministros Carlos Alberto Menezes Direito (in memorian), Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, este último que assinalou significar a palavra concubinato, do latim concubere, “compartilhar o leito”, enquanto que a união estável significa “compartilhar a vida”.

O STF, em 14.12.2020, concluiu o julgamento do RE 1.045.273/ SE, e estabeleceu a seguinte repercussão geral (Tema 529):

"A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723, parágrafo 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional”.

Em 27/4/2021, o STJ ao afastar pretensão de divisão de pensão por morte de funcionário público entre a viúva e a concubina ( REsp 1894963/ AL, 03/05/2021), frisou-se:

"[...] na forma da jurisprudência de há muito firmada pelo STJ, 'há distinção doutrinária entre 'companheira' e 'concubina'. [...] Companheira é a mulher que vive, em união estável, com homem desimpedido para o casamento ou, pelo menos, separado judicialmente, ou de fato, há mais de dois anos, apresentando-se à sociedade como se com ele casada fosse. Concubina é a mulher que se une, clandestinamente ou não, a homem comprometido, legalmente impedido de se casar. Na condição de concubina, não pode a mulher ser designada como segurada pelo cônjuge adúltero, na inteligência dos artigos 1.177 e 1.474 do Cód. Civil de 1916' [...]"."[...] 'não demonstrada a boa-fé da concubina de forma irrefutável, não se revela cabida (nem oportuna) a discussão sobre a aplicação analógica da norma do casamento putativo à espécie' [...]".

- Fonte: Consulta no site oficial do STF e do STJ.




 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.