segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

É possível cumular pedidos de prisão e de penhora na mesma execução de alimentos (STJ: REsp 1.930.593/ MG, REsp 2.004.516/ RO e Informativo de Jurisprudência nº 744)

A cobrança dos alimentos no atual Código de Processo Civil, via de regra, se processa nos mesmos autos que os fixou ou homologou o acordo, através de cumprimento de sentença, de duas formas:

I.- RITO DA PRISÃO – ( aqui, modelo de petição) - Por esse modo é possível cobrar os alimentos ATUAIS, que compreendem as 03 (três) últimas parcelas anteriores ao ajuizamento da ação, mais as que se vencerem no curso do processo (CPC art. 528, § 3º e § 7º e art. 911 e Súmula nº 309, do STJ). Importante salientar que o devedor será intimado PESSOALMENTE, para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo, sob pena de decretação de sua prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses ( CPC, artigo 528§ 3º, 7º, e artigo 911). Os artigos acima conferem efetividade à tutela jurisdicional constitucional (art. LXVII, da CF), que prevê meio executório que possibilita a restrição da liber-dade individual do devedor de alimentos, de caráter excepcional; e
II.- RITO DA EXPROPRIAÇÃO (PENHORA) – ( aqui, modelo de petição) - Por esse rito se cobram os alimentos pretéritos, que perderem o caráter de urgência ( CPC, artigo 523§ 1º e artigo 831). O devedor será intimado, NA PESSOA DE SEU ADVOGADO ( CPC, artigo 513§ 2ºI), para pagar o débito em 15 dias, sob pena de incidir multa de 10% e honorários advocatícios em igual percentual, previstos no CPC, artigo 523§ 1º, além de se sujeitar à penhora de bens ( CPC, artigo 831).

O Judiciário não admitia que, simultaneamente, em um mesmo processo, se cumulasse os ritos expropriatório (penhora) e coercitivo (prisão civil), com fulcro na vedação do artigo 780, do CPC, aliado a possibilidade de a cumula-ção causar tumulto processual, exatamente pela diversidade insuperável dos ritos, comprometendo o eficaz e célere atendimento das urgentes necessidades do exequente do crédito alimentar, geralmente menor de idade.

Frise-se, por oportuno, que cumprido o prazo da prisão civil, é possível a conversão da ação para para o rito da penhora, conforme autoriza o CPC, em seu artigo 530: “Não cumprida a obrigação, observar-se-á o disposto nos artigos 831 e seguintes”.

Ocorre, no entanto, que a 4ª Turma do STJ, ao julgar o REsp 1.930.593/ MG, em 9/8/2022, sob a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, inovou ao decidir que é cabível a cumulação das técnicas executivas da coerção pessoal (prisão) e da coerção patrimonial (penhora) no âmbito do mesmo processo executivo de alimentos.

Informativo de Jurisprudência nº 744, de 15.8.2022, trouxe o destaque:

"Na cobrança de obrigação alimentar, é cabível a cumulação das medidas executivas de coerção pessoal e de expropriação no âmbito do mesmo procedimento executivo, desde que não haja prejuízo ao devedor nem ocorra qualquer tumulto processual".

O julgado restou assim ementado:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. CUMULAÇÃO DE TÉCNICAS EXECUTIVAS: COERÇÃO PESSOAL (PRISÃO) E COERÇÃO PATRIMONIAL (PENHORA). POSSIBILIDADE, DESDE QUE NÃO HAJA PREJUÍZO AO DEVEDOR NEM OCORRA NENHUM TUMULTO PROCESSUAL IN CONCRETO. 1. Diante da flexibilidade normativa adotada pelo CPC/2015 e do tratamento multifacetado e privilegiado dos alimentos, disponibilizou o legislador diversas medidas executivas em prol da efetividade da tutela desse direito fundamental. 2. Cabe ao credor, em sua execução, optar pelo rito que melhor atenda à sua pretensão. A escolha de um ou de outro rito é opção que o sistema lhe confere numa densificação do princípio dispositivo e do princípio da disponibilidade, os quais regem a execução civil. 3. É cabível a cumulação das técnicas executivas da coerção pessoal (prisão) e da coerção patrimonial (penhora) no âmbito do mesmo processo executivo de alimentos, desde que não haja prejuízo ao devedor (a ser devidamente comprovado) nem ocorra nenhum tumulto processual no caso em concreto (a ser avaliado pelo magistrado). 4. Traz-se, assim, adequação e efetividade à tutela jurisdicional, tendo sempre como norte a dignidade da pessoa do credor necessitado.
No entanto, é recomendável que o credor especifique, em tópico próprio, a sua pretensão ritual em relação aos pedidos, devendo o mandado de citação/intimação prever as diferentes consequências de acordo com as diferentes prestações. A defesa do requerido, por sua vez, poderá ser ofertada em tópicos ou separadamente, com a justificação em relação às prestações atuais e com a impugnação ou os embargos a serem opostos às prestações pretéritas.
5. Na hipótese, o credor de alimentos estabeleceu expressamente a sua "escolha" acerca da cumulação de meios executivos, tendo delimitado de forma adequada os seus requerimentos. Por conseguinte, em princípio, é possível o processamento em conjunto dos requerimentos de prisão e de expropriação, devendo os respectivos mandados citatórios/ intimatórios se adequar a cada pleito executório. 6. Recurso especial provido.
(STJ, REsp n. 1.930.593/MG, relator Ministro Luis Felipe Salomão, 4a Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 26/8/2022) - Grifo nosso.

São as informações do inteiro teor do julgado supra:

i) A controvérsia está em definir sobre a viabilidade de se cumular as técnicas executivas da coerção pessoal (prisão) e da coerção patrimonial (penhora) no mesmo processo para cobrança de obrigação alimentar; ii) A corrente que defende a vedação de cumulação se vale basicamente de dois fundamentos: de que a adoção ensejaria tumulto processual e de que há expressão vedação legal ( CPC/2015, art. 780); iii) Segundo esse ponto de vista, por haver diversidade procedimental entre o rito da prisão e o da expropriação, seria inviável a junção dos ritos no âmbito da mesma execução de alimentos. Tal normativo teria justamente o intento de evitar o aparecimento de tumulto processual em razão da cumulação de execuções sob ritos diversos; iv) Em sentido inverso estão os favoráveis à junção das técnicas. Defendem que não há vedação legal, que o novo CPC tem como escopo a flexibilidade procedimental, de que há incidência dos princípios da economia, celeridade, eficiência, além de não ser possível presumir a existência de prejuízo. Por fim, têm como principal fundamento o fato de que a execução de alimentos foi prevista para prestigiar o alimentado, credor de alimentos e, por conseguinte, seria facultado a ele cumular ou não os ritos dentro do mesmo procedimento executivo; v) Conforme a doutrina, a análise sobre a cumulação de requerimentos em um cumprimento de sentença "exige que se olhe para o direito material, em primeiro lugar. Só se estará verdadeiramente diante de cumulação de 'efetivações de direitos' quando tenha havido mais de uma pretensão manifestada em juízo, inicialmente. Do contrário, estar-se-á apenas diante de verificação ou não da cumulabilidade de técnicas executivas (em relação a uma só pretensão)"; vi) Não se pode baralhar os conceitos de técnica executiva e procedimento executivo, pois os instrumentos executivos servem, dentro da faculdade do credor e da condução processual do magistrado, justamente para trazer eficiência ao rito procedimental; vii) Dessarte, em razão da flexibilidade procedimental de nosso sistema processual e da relevância do bem jurídico tutelado em questão, deve-se adotar um posicionamento conciliatório entre as correntes divergentes, conferindo-se concretude à opção procedimental do credor de alimentos, sem se descuidar de eventual infortúnio prático a ser sopesado no caso em concreto, trazendo adequação e efetividade à tutela jurisdicional, tendo sempre como norte a dignidade da pessoa do credor necessitado; viii) Assim, em regra, é cabível a cumulação das medidas executivas da coerção pessoal e da expropriação no âmbito do mesmo procedimento executivo, desde que não haja prejuízo ao devedor (a ser devidamente comprovado por ele) nem ocorra qualquer tumulto processual, ambos a serem avaliados pelo magistrado no caso concreto; ix) Por outro lado, é recomendável que credor especifique, em tópico próprio, a sua pretensão ritual em relação a eles, assim como o mandado de citação/intimação deverá prever as diferentes consequências de acordo com as diferentes prestações. A defesa do requerido, por sua vez, poderá se dar em tópicos ou, separadamente, com a justificação em relação as prestações atuais e impugnação ou embargos para se opor às prestações pretéritas; x) Apenas se houver demonstração de algum prejuízo pelo devedor ou se o magistrado vislumbrar a ocorrência de tumulto processual em detrimento da prestação jurisdicional é que se determinará a cisão do feito, como o apensamento em apartado de um dos requerimentos; xi) A delimitação do alcance de cada pedido é apta a afastar, em tese, algum embaraço processual, cindindo-se o feito diante das técnicas executivas pleiteadas de forma a permitir que a parte adversa tenha conhecimento de que e de como se defender; xii) Tal solução atende a um só tempo os princípios da celeridade, da economia, da eficiência e da proporcionalidade, atendendo aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana, nos termos exigidos pelo art.  do CPC/2015, prestigiando o alimentando na busca do recebimento do seu crédito alimentar (indispensável à sua sobrevivência), exatamente o ser vulnerável a quem o procedimento executivo visa socorrer.

No mesmo sentido inovou a 3a Turma do STJ ao julgar o REsp n. 2.004.516/ RO, cuja ementa segue reproduzida, na parte que interessa:

"(...) Recurso especial conhecido e provido, para desde logo autorizar a tramitação conjunta, no mesmo processo, do cumprimento de sentença dos alimentos pretéritos e dos atuais, devendo o mandado de intimação do devedor especificar, precisamente, quais parcelas ou valores são referentes aos pretéritos e quais parcelas ou valores são referentes aos atuais, com as suas respectivas consequências"
(STJ, REsp n. 2.004.516/RO, relatora Ministra Nancy Andrighi, 3a Turma, julgado em 18/10/2022, DJe de 21/10/2022).

Fonte: STJ - Superior Tribunal de Justiça.

- Leia nosso artigo: "Ação de Execução de Alimentos no NCPC e Cumprimento de Sentença - Com modelos de petições pelo rito da prisão e da penhora"

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