sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Prisão civil não se justifica se for ineficaz para fazer devedor quitar dívida alimentar, diz STJ

 

Como sabido, a prisão civil do devedor de pensão alimentícia não é uma punição (pena ou sanção), mas uma forma de persuadir o responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável a quitar a obrigação, conforme o artigo 528, § 3º, do CPC/ 2015, que confere efetividade a0 artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal.

Portanto, não é justificável sua decretação se for ineficaz para compelir o devedor ao pagamento da dívida, mesmo nos casos em que o débito se avolumou de forma significativa.

Seguindo esse norte, por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso em Habeas Corpus ( RHC nº 176091/ RJ) para um homem que deve R$ 42,8 mil de pensão alimentícia.

A filha, representada pela mãe, requereu a prisão civil do pai para obrigá-lo a quitar a dívida. No HC, o homem defendeu que passou por períodos de desemprego, nos quais fazia pagamentos parciais de acordo com suas possibilidades financeiras.

Em janeiro do ano passado, o homem conseguiu emprego com carteira assinada e uma decisão liminar para reduzir o valor da pensão. Ele passou a receber R$ 1,8 mil por mês e a pagar R$ 496,85, descontados direto da folha de pagamento.

O magistrado considerou que a obrigação vem sendo regularmente cumprida, e a manutenção da prisão civil, “além de não se mostrar legítima, também não parece ser o melhor caminho, inclusive para a própria alimentada, ante a possibilidade de nova interrupção do pagamento, comprometendo o equilíbrio finalmente alcançado entre as partes".

No entendimento do relator, ministro Raul Araujo, o calote não foi voluntário e inescusável, pois ficou comprovada a incapacidade financeira do pai de arcar com a pensão da filha em sua totalidade. Atualmente, a obrigação vem sendo regularmente cumprida. Também não foi identificado risco para a filha, nem urgência na percepção da dívida acumulada.

O ministro destacou, porém, que o valor ainda precisa ser pago." Pode a cobrança prosseguir por meio mais adequado, restrito à disponibilidade patrimonial do devedor ", ou seja, pelo rito da penhora.

Leia também nosso artigo Justificativas que afastam a Prisão Civil do devedor de pensão alimentícia - Acolhidas pelos Tribunais"(clique aqui).

O julgado restou assim ementado:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. DECRETO DE PRISÃO. DÍVIDA PRETÉRITA ACUMULADA EM RAZÃO DE DESEMPREGO. PAGAMENTO PARCIAL DA PENSÃO DURANTE TODO O PERÍODO DE DESEMPREGO. ATUAL ADIMPLEMENTO DA PENSÃO REDUZIDA EM AÇÃO REVISIONAL. RECURSO PROVIDO. ORDEM CONCEDIDA. LIMINAR CONFIRMADA.
1. A prisão civil do devedor de alimentos, com fundamento no art. 528§ 3º, do CPC/2015 (art. 733parágrafo único, do CPC/1973), não é pena ou sanção, mas técnica jurisdicional, de natureza excepcional, voltada ao cumprimento da obrigação pecuniária, não se justificando quando for ineficaz para compelir o devedor a satisfazer integralmente o débito que se avolumou de forma significativa.
2. Os autos comprovam que o paciente passou por longo período de desemprego, razão pela qual não teve como cumprir a obrigação nos termos em que avençada (90% do salário mínimo), realizando sempre pagamentos parciais, dentro de suas possibilidades. Não obstante empregado atualmente como operador de computador, o paciente recebe o equivalente a R$ 1.800,00 (valor bruto), não se encontrando em condições de quitar a dívida pretérita, acumulada desde 2018, de R$ 42.851,50 (atualizada em fevereiro de 2022).
3. Não se nota o risco para a alimentada, nem urgência na percepção da dívida pretérita acumulada, já que, além de receber atualmente a pensão alimentícia descontada em folha de pagamento, no montante de R$ 496,85, em virtude de decisão proferida em ação revisional, também recebe, desde 10/12/2020, alimentos do avô paterno no valor de 10% dos seus proventos de oficial de justiça aposentado.
4. Diante de tais circunstâncias, verifica-se que o inadimplemento não se apresenta inescusável e voluntário, assim como previsto na Constituição Federal, em seu art. 5º, LXVII, para admitir, excepcionalmente, a prisão civil do devedor de alimentos.
5. Recurso ordinário provido para conceder a ordem de habeas corpus.
Liminar confirmada.
RHC n. 176.091/RJ, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 27/4/2023, DJe de 4/5/2023).

Frise-se que no caso analisado, a prisão foi afastada porque o STJ entendeu que o calote não foi voluntário e inescusável. Ao contrário, ficou comprovada a incapacidade financeira do pai de arcar com a pensão da filha em sua totalidade, havendo pagamento parcial em todo o período. Podendo a cobrança prosseguir por meio mais adequado, restrito à disponibilidade patrimonial do devedor (rito da penhora).

DEMAIS CONSEQUENCIAS DO INADIMPLENTO ALIMENTAR:

Criminal - Não pagar, sem justa causa, pensão alimentícia ou abandonar emprego com esse fim, caracteriza o crime de abandono material previsto no artigo artigo 244 do Código Penal, nos termos seguintes:

Art. 244 = Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: - Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. - Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.

Portanto, além da PRISÃO CIVIL, que pode ser decretada pelo prazo de 01 (um) a 03 (três) meses nas hipóteses de, intimado, o devedor em 03 (três) dias, não pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade absoluta de efetuá-lo ( CPC art. 528§ 3º e § 7º e art. 911 e Súmula nº 309, do STJ) há, também, a previsão de punição na seara criminal.

Código de Processo Civil de 2015, deu ainda mais efetividade à apuração e punição do CRIME DE ABANDONO MATERIAL, pois autorizou, no curso do processo de execução de alimentos, o credor requerer ao Juízo que oficie ao Ministério Público, no caso de conduta procrastinatória por parte do executado, para verificação de prática de abandono material, conforme autoriza o artigo 532, do CPC“Verificada a conduta procrastinatória do executado, o juiz deverá, se for o caso, dar ciência ao Ministério Público dos indícios da prática do crime de abandono material”, crime previsto no artigo 244, do Código Penal.

Além do devedor direto dos alimentos, a legislação prevê punição a outras pessoas que ajudam a frustrar a implementação do pagamento da pensão alimentícia. Estamos falando do CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA, previsto no artigo 22, da Lei nº 5.478/ 68 ( Lei de Alimentos), que diz constituir crime deixar o empregador ou funcionário público de prestar ao Juízo informações necessárias à instrução de processo ou execução de sentença ou acordo que fixe pensão alimentícia. Também comete referido crime quem ajuda o devedor a eximir-se ao pagamento da pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada, ou se recusa, ou procrastina a executar ordem de desconto em folha de pagamento, expedida pelo juiz competente. Pena: Detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, sem prejuízo da pena acessória de suspensão do emprego de 30 (trinta) a 90 (noventa) dias.

Da retirada do sobrenome paterno ou materno por abandono afetivo e material - Os tribunais têm acolhido pedidos dos filhos para suprimirem os sobrenomes dos pais por abandono afetivo e material ( clique aqui para ler).

Indenização por abandono afetivo e material - Cabível ainda condenação dos genitores em reparação por danos morais. Tratamos de casos reais, com valores, neste artigo.

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